Desaquecimento da economia brasileira limita expansão do HVAC-R

A onda de pessimismo e desconfiança que varre a economia brasileira não deve parar de crescer nos próximos meses, ao contrário do Produto Interno Bruto, que foi jogado na lona graças a uma série de fatores que inibem a vontade de qualquer investidor, entre os quais a gestão fiscal frouxa e sem transparência, a deterioração dos indicadores macroeconômicos e a falta de reformas estruturais.

A recente alta da taxa básica de juros para 11,25% ao ano também não agradou o setor industrial. Em nota, a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) alertou que a economia está encolhendo. “A elevação da taxa Selic não só impede qualquer tipo de retomada da atividade econômica no curto prazo, como também derruba ainda mais a confiança de empresas e consumidores”, diz o texto. Por isso, a entidade projeta forte recuo – em cerca de 7% – para o investimento na economia em 2014. Embora sempre cresçam bem acima da média do PIB, as companhias do HVAC-R poderiam ter se expandido mais este ano, não fosse esse conjunto de dados negativos, conforme avaliam empresários e profissionais do setor ouvidos pela Revista do Frio.

“Assim como a inflação e a variação cambial, os reajustes de preços regulados pelo governo e o aumento da Selic geram impactos em nossos custos”, informa o diretor geral da Armacell América do Sul, Marcio Nieble.

Segundo o executivo, a incerteza na área econômica, que foi forte durante todo o ano, dificultou o planejamento e a tomada de decisões no meio empresarial, impactando na definição e realização de investimentos em novas obras e em retrofits, que resultariam em mais negócios para as empresas do segmento de termoisolantes.

Apesar disso, a subsidiária da multinacional alemã deve encerrar 2014 com dois dígitos de crescimento em suas vendas no País, em comparação com o ano anterior.

“Para a obtenção desse bom resultado, foi fundamental o trabalho que realizamos para aumentar nossa presença nos diversos mercados de HVAC-R e ampliar a nossa penetração geográfica, chegando a novos clientes. Outros fatores-chave para isso foram a oferta de serviços cada vez melhores, um portfólio de produtos mais amplo e o relacionamento mais próximo com nossos distribuidores e representantes”, explica.

“Para as indústrias que possuem fábrica no Brasil, o impacto da inflação é terrível, refletindo diretamente na competitividade e, consequentemente, na lucratividade das empresas”, analisa o presidente da Heatcraft no País, Ricardo Freitas.

De acordo com o executivo da multinacional norte-americana, o Brasil vinha numa forte trajetória econômica crescente nos últimos anos, que culminou numa desaceleração abrupta em 2014 em função de dois eventos cruciais: a Copa do Mundo de Futebol e as eleições.

“Nossas vendas cresceram 7% este ano, mas só por causa de ações competitivas que temos implementado nas áreas de atendimento, tecnologia, treinamento e marketing; ou seja, esse resultado poderia ter sido melhor, caso a política econômica brasileira fosse mais bem- sucedida”, destaca.

Além da inflação crescente, do câmbio instável e dos preços regulados em ascensão – energia elétrica e combustíveis, principalmente –, outros indicadores que influenciam diretamente os custos em grande parte das empresas do setor de aquecimento, ventilação, ar condicionado e refrigeração têm sido as variações dos preços de commodities metálicas como aço, alumínio, cobre e latão, no mercado internacional. Restrições ao crédito ao consumidor final e o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) mais elevado para eletrodomésticos da linha branca foram também fatores que, ao longo do ano, desaceleraram o crescimento do HVAC-R. “Em se tratando de vendas de refrigeradores, o primeiro semestre de 2014 foi o pior dos últimos 10 anos”, lamenta o diretor comercial da Vulkan do Brasil, Mauro Mendonça.

“Mas graças aos nossos lançamentos, em especial de novos pontos de união para sistemas de refrigeração, não fomos muito afetados pelo desaquecimento da economia entre 2013 e 2014”, pondera o executivo, lembrando que a filial brasileira da empresa alemã continua sendo a primeira do mundo em termos de faturamento, entre suas 19 subsidiárias. “Só perdemos para a matriz”, completa.

Com o PIB da produção industrial negativo, a falta de incentivos para fomentar o setor e a desconfiança do empresariado para realizar investimentos, algumas indústrias instaladas no País vêm reduzindo suas margens para manter a participação no segmento. É o caso, por exemplo, da Termomecanica.

“Iremos fechar 2014 com crescimento de vendas na ordem de 5% em volume no segmento de refrigeração. Entretanto, na ótica financeira, este percentual é absorvido, devido à redução das margens para manter a fatia no mercado”, confirma o gerente de vendas da companhia, Marcelo Silva.

OPORTUNIDADES

O Brasil já é o oitavo maior consumidor mundial de eletricidade, e o quarto mais caro em termos de custos de energia. Segundo o relatório do Balanço Energético Nacional 2013, o setor industrial continua encabeçando a lista, com 33,9% da demanda total.

O recente aumento de 40,7% na tarifa de energia elétrica da distribuidora Elektro, autorizado em agosto pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), afetou centenas de municípios do estado de São Paulo e do Mato Grosso do Sul, impactando os custos adicionais das indústrias na compra de energia, que acabam sendo repassados para todos os níveis do setor produtivo.

Para muitas empresas do HVAC-R, essas estatísticas representam uma oportunidade, já que os projetos de automação em prédios existentes para melhoria da eficiência energética em indústrias, shopping centers, aeroportos e condomínios verticais impulsionam o setor. “Por isso, vamos crescer 30% este ano”, destaca o engenheiro Fabio Moacir Korndoerfer, diretor comercial da brasileira RecomService.

“No caso de novos edifícios, o Brasil está entre os cinco principais países do mundo com projetos de certificação LEED, que abrange cerca de três milhões de GSM, na sigla em inglês (metros quadrados cúbicos) em espaço certificado. E esse número vai continuar a crescer”, ressalta o chefe do canal corporativo da Trane Brasil, Diogo Prado.

Diante desse cenário, a marca norte-americana do grupo Ingersoll Rand aposta no desenvolvimento de soluções adaptadas a essa demanda da construção civil. Outra multinacional que enxerga na escassez energética uma oportunidade para expandir seus negócios é a dinamarquesa Danfoss.

“No verão, o aumento do uso do ar-condicionado eleva o consumo de energia elétrica. Por isso, temos uma linha de compressores de velocidade variável que pode gerar economia na ordem de 20%. Temos, ainda, controles que melhoram o desempenho dos equipamentos, além de trocadores de calor de alta performance do tipo microcanal”, exemplifica o presidente da companhia na América Latina, Julio Molinari. “Atualmente, existem diversas tecnologias energeticamente eficientes e que reduzem as emissões de CO2 disponíveis para áreas como refrigeração de alimentos, ar condicionado, aquecimento de edifícios e controle de motores elétricos. Os sistemas de controle de refrigeração, por exemplo, garantem que o consumo de energia seja, automaticamente, correspondente à necessidade real”, acrescenta.

De acordo com o diretor comercial da brasileira Protelim, Alexandre Carlos França, a falta de chuva e o tempo seco também vêm aumentando a demanda pelos serviços de manutenção e limpeza de ar-condicionado. “Isso fez com que nossas vendas de produtos de higienização aumentassem 5% ao longo deste ano”, diz o empresário.

Expectativas

Todos os entrevistados pela Revista do Frio concordam que a conjuntura econômica dificultou a atuação das empresas do HVAC-R durante 2014. “É muito complexo operar num mercado como o nosso, ainda mais com tantas interferências negativas”, observa o empresário Kiko Egydio, diretor da K11, firma nacional especializada na importação e distribuição de produtos para limpeza e manutenção de ar-condicionado. “Apesar desse cenário, o HVAC-R brasileiro é imenso e tem grande potencial de crescimento, pois, embora o setor seja estruturado empresarial e profissionalmente, ainda há uma demanda muito grande por tecnologias e serviços especializados”, completa.

Os números decepcionantes de 2014 também não tiram o ânimo das empresas que já passaram pelas mais diversas fases da economia brasileira. “Neste ano, o nosso crescimento seguiu dentro do esperado, chegando a 23%, se comparado com o ano passado”, comemora o empresário Antonio Gobbi, diretor da Full Gauge.

Mesmo num ano marcado pelas incertezas geradas pelo cenário político-eleitoral e fraco desempenho econômico, o setor não deixou – e nem pretende deixar – de investir, uma atitude que destoa da maioria dos segmentos produtivos.

“Em 2015, indiferente do panorama econômico, manteremos a política de trabalhar, cada vez mais, com ações inovadoras, sempre aumentando o investimento em desenvolvimento de novos produtos e marketing”, garante o executivo.

Embora o porvir seja incerto, os empresários e profissionais do HVAC-R acreditam que a expansão do PIB em 2015 dependerá do equilíbrio de quatro fatores: consumo, investimento, gastos públicos e balança comercial.

“Estamos numa época muito difícil para acertar as previsões, mas se o governo ajustar suas contas no ano que vem, isso acabará influenciando, de forma positiva, a economia como um todo”, analisa o empresário Robert van Hoorn, diretor da MultiVac e MPU.

Enfim, todos os players do setor mantêm sua confiança no potencial do Brasil e enxergam perspectivas favoráveis para os próximos anos, uma vez que o processo de desenvolvimento econômico e social do País continuará a exigir investimentos em inúmeros obras e instalações nas quais as tecnologias do HVAC-R são imprescindíveis, caso de indústrias, centros de armazenagem e logística, edifícios de escritórios, shoppings, hospitais, hotéis e outros empreendimentos.
 
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